faixa 1: tempo de pipa
"Vamos nos espalhar sem linhas
ver o mundo girar de cima
no tempo da preguiça."
ver o mundo girar de cima
no tempo da preguiça."
Já
faz algum tempo desde o último “Músicas e Divagações” aqui no blog, que, pra
quem não lembra, é apenas uma boa desculpa para ouvir música bacana e falar —
reclamar? — da vida. E, sinceramente, tudo que estou precisando hoje é isso.
Mas
para falar do Cícero, primeiramente eu tenho que falar (em linhas bem gerais,
senão precisaria de todo o post) do meu bom amigo André Felipe — o Dé para os íntimos.
Na verdade, a nossa amizade já nasceu nos frutíferos caminhos da música, quando
o last.fm apontou-nos como vizinhos, devido ao nosso compatível gosto musical. Infelizmente,
uma vizinhança virtual, e aquele café para falar da vida num fim de tarde, por
ora, não pôde acontecer. Entretanto, isso nunca foi empecilho para a boa
amizade que compartilhamos, que acabou criando laços que vão bem além do gosto
musical, embora seja sempre muito bem entrelaçada com as notas ressoantes de
nossas bandas favoritas. E foi numa dessas conversas em que ele tanto me ajuda
a colocar a cabeça no lugar que ele disse: “Você já ouviu o Cícero? Você vai se
identificar, ele fala de muitas coisas que você está sentindo agora.”
faixa 2: vagalumes cegos.
"Fica bem aí
Que essa luz comprida
Ficou tão bonita
Em você daqui"
Que essa luz comprida
Ficou tão bonita
Em você daqui"
Bom,
isso foi há dois meses atrás. Eu juro que tento manter meus downloads em dia,
ouvir as boas dicas que meus amigos me dão, os tantos discos que saem, mas não
dou conta nessa vida corrida de auxiliar-de-escritório-estudante-de-letras-estagiário-blogueiro-nas-horas-vagas.
Mas, quando finalmente baixei e as cordas do violão deram forma aos primeiros
segundos de “Tempo de Pipa”, eu senti uma emoção diferente. Sério. E eu só
pensava “Esse Dé me conhece mesmo.”
A
verdade é que esse álbum do Cícero, gravado de forma independente e
disponibilizado gratuitamente para download (vide link lá no fim do post) tem
um ambiente, uma aura, uma essência — não sei exatamente qual dos três ou quem
sabe os três juntos? — que, indubitavelmente, serve-me de espelho no momento
pelo qual estou passando.
faixa 3: cecília e os balões.
"Pra começar a descobrir
o que é chegar e o que é partir
o coração só precisa de ar"
o que é chegar e o que é partir
o coração só precisa de ar"
Vai
além das letras, que são de poesia simples — e nada simplória —, de palavras
sutilmente selecionadas, de universalização de sentimentos. Cícero narra com
beleza e sem obviedade sensações simples, delicadas, aquelas pelas quais todos
nós já passamos, mas que temos tanta dificuldade de expressar. Vai além da
musicalidade também, embora as notas suaves, a voz doce de Cícero, as nuances,
a atmosfera íntima e acolhedora do álbum sejam parecidas com as de outros músicos
que ouço. Eu não sei exatamente o que foi que me emocionou de tal forma desde a
primeira audição de “Canções de Apartamento”. Creio que ele tenha se encaixado
perfeitamente como a trilha sonora de emoções que vinham se aflorando dentro de
mim nesses últimos dias e, de certa forma que não consigo identificar com
precisão, as canções ajudaram-me a atravessar esse período emocionalmente crítico.
faixa 4: joão e o pé-de-feijão
"Ainda não fazem pessoas de algodão
Ainda não fazem pessoas que enxuguem
suas próprias
mágoas"
Ainda não fazem pessoas que enxuguem
suas próprias
mágoas"
Eu
diria que este álbum tem muito do que vejo em minha essência, por assim dizer. Diria
mais: se tivesse sido agraciado com algum talento musical ou com a capacidade
de dominar as palavras, de adestrá-las — porque as palavras ainda me são feito
feras ariscas e, possivelmente, sempre serão —, talvez o resultado de minhas andanças
pelos caminhos artísticos beiraria algo muito próximo dessa sutileza do Cícero
de falar dos sentimentos. Mas, como me falta o talento — tanto o musical quanto
o linguístico —, resta um sentimentalismo um tanto exacerbado quando procuro expressar
o que sinto em textos. Bom,
é sorte que, ao menos, bom gosto e sensibilidade foram me dado para poder
apreciar um belo disco como este.
"Não se esqueça
por enquanto
de esquecer alguma coisa
pela casa
e vir buscar do nada"
por enquanto
de esquecer alguma coisa
pela casa
e vir buscar do nada"
“Canções
de Apartamento” tem cara de dia chuvoso, daqueles em que você fica
preguiçosamente esparramado na cama desarrumada, apreciando a chuva molhar o
vidro da janela. É assim, sem pressa, sem clímax, sem urgência. É aquela
tristeza com a qual você já se acostumou, que ficou ali, em algum cantinho do
seu coração e às vezes cisma de doer novamente. Mesmo quando fala de rompimentos,
assunto doloroso que pode virar circo de sentimentalismo, Cícero é calmo,
dosado, certeiro. Nesta canção, por exemplo, é linda a forma como a gente
consegue atribuir forma aos versos, se identificar com aquela sensação de perda
que, inevitavelmente, volta a bater em horas menos esperadas, quando notamos,
por exemplo, algo que a pessoa esqueceu em nossa casa — ou na nossa vida.
faixa 6: açúcar ou adoçante?
"Fica um pouco mais
Que tal mais um café
Ainda lembra disso?
Que bom."
Que tal mais um café
Ainda lembra disso?
Que bom."
E
entre os versos sussurrados de Cícero, me pego refletindo sobre como meus
sentimentos estão às avessas, desestruturados, completamente bagunçados dentro
de mim. A ausência, no meu caso, não é serena, como canta o músico. Tenho
explosões diárias de emoções, nem sei mais descrever as coisas que sinto. Se me
perguntam se estou bem, não sei responder, essa é a verdade. Mas, no fundo, eu
sinto que isso é bem normal, depois que você vive um período muito feliz e,
logo em seguida, precisa enfrentar novamente os aspectos indesejáveis da sua
vida. É como li esses dias em algum lugar: “tenho medo de ser feliz, porque
felicidade nunca dura.”
faixa 7: eu não tenho um barco, disse a árvore.
"a gente sempre deixa de cuidar
do que já tem na mão"
do que já tem na mão"
Mas
a minha identificação com este disco vai no extremo oposto: não é nas
incertezas emocionais, nas oscilações pelas quais tenho passado que me vejo
refletido, mas nessa melancolia tênue que passeia por todo o álbum. É no cinza
que descolore as letras que me encontro.
"Vamos dançar
qualquer coisa
é melhor
que tristeza
por favor
Se esqueça"
qualquer coisa
é melhor
que tristeza
por favor
Se esqueça"
O
Cícero fez um clipe lindão para divulgar esse álbum, para faixa “Tempo de Pipa”
(minha favorita e, possivelmente, uma das minhas músicas brasileiras favoritas
do ano). Gravado em plano-sequência, o bondinho de Santa Teresa e um melancólico
Rio de Janeiro ao amanhecer servem de pano de fundo para o lindo clipe. Confere
aqui:
9. pelo interfone.
"se tu soubesses o quanto machuca
não amaria mais ninguém."
E
já que estamos falando de clipes, vale a pena também deixar a dica do site do
meu amigo Dé, o Música Pavê, do qual sou fã de carteirinha (e juro que isso não
é puxação de saco, rs). E um agradecimento especial a ele por tudo que já fez
por mim nesse tempo que a gente se conhece. E, olha, não foi pouca barra que
esse cara já me ajudou a passar, viu.
10. ponto cego.
"é sexta-feira, amor!"
E,
finalizando, você pode baixar o álbum do Cícero na íntegra no link abaixo. Agradecer
ao músico, porque disponibilizar um álbum lindo desses de graça é realmente um
presente. E, coincidentemente, a sexta-feira acaba ao clima melancólico desses
versos. “Canções de Apartamento” é uma boa companhia para dias assim, com certeza.
download: cicero.net.br
facebook: facebook.com/cancoes.de.apartamento
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