quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

5 fatos que marcaram 2009 (na minha vida, obviamente).



Crise econômica? Morte do Michael Jackson? A Fazenda? Putaria no Planalto?

Eita... Se é isso que procura, você pegou a retrospectiva errada. Por aqui aparecerão apenas pequenas desimportâncias que tornaram o ano de 2009 único, ímpar, diferente de todos os outros 23 anos que já vivi. Uma singela narrativa dos fatos que mudaram meu ponto de vista, que trouxeram algum aprendizado, alguma lição, e que me fizeram evoluir, crescer e amadurecer de alguma forma. Esses são os 5 fatos que marcaram o ano de 2009 para mim.


5 - Mudança de Trabalho.

Em meados de julho, meu então patrão, Vinícius, me chamou em um canto da loja e, munido de desculpas esfarrapadas, disse que meus serviços estavam sendo dispensados. Eu estava insatisfeito com o "Inferninho do Doce" há um bom tempo, é verdade, o que não impediu que a notícia me causasse um baque; já trabalhava lá há mais de um ano, era completamente acostumado com o ambiente, com minhas funções, com os clientes e com a amizade com meus companheiros de trabalho. Mas, assim que a primeira impressão passou e quando percebi que estava finalmente livre de um trabalho que estava até mesmo me causando infelicidade, fui domado por um sentimento de alívio inenarrável. Tive meus meses de descanso merecidos - até um pouco mais do que devia, já que por volta de outubro me sentia até mesmo entediado com tanto tempo vago - e aproveitei para me empenhar mais na faculdade, já que no primeiro semestre tinha que dividir o tempo de preparar os trabalhos com minhas obrigações no Inferninho do Doce.

Até que, no fim de outubro, meu telefone tocou e, surpreendentemente, fui chamado para fazer uma entrevista num escritório de contabilidade onde havia deixado currículo há anos atrás. Em novembro, comecei um período de experiência, onde fui auxiliado por uma amiga minha de longa data, que também trabalha lá. Mesmo rodeado por números, uma das coisas que eu mais odeio no planeta Terra, posso dizer que o ambiente de trabalho é ótimo, que eu, Talize e Leandro temos nos dado muito bem e que os patrões têm me tratado com muito respeito. Por tudo isso, espero conseguir domar os malditos números para permanecer neste emprego por um bom tempo.


4 - Léo.

Todo ano, de alguma forma, um determinado número de pessoas passa a fazer parte da sua vida. Nem sempre são pessoas que acrescentam alguma coisa, que mudam sua rotina ou que fazem você pensar de uma forma diferente. Ás vezes são só presenças efêmeras, que você nem terá chance de conhecer direito. Mas esse ano, em especial, eu fui agraciado com um nova amizade que foi, sem qualquer sombra de dúvidas, o precursor das maiores risadas e dos momentos mais descontraídos e felizes do ano.

Foi meio por acaso que conhecemos o Léo. Estávamos no Fulana de Tal, vendo uma amiga nossa e sua banda tocarem, quando, por falta de opção, ele sentou-se à nossa mesa, com um grupo de amigos. Nesta mesma noite conhecemos também a Jojo e a Cecília e foi uma das noites mais divertidas do ano, com certeza. Então, o Léo fez aparições periódicas, tipo estrela de cinema. Achávamos ele de vez em quando em algum boteco ou em algum show das Fulanas, até que o obrigamos a deixar tal displicência de lado e marcar um almoço na casa dele - almoço que ele vinha prometendo meses a fio.

Aquele domingo foi, sem sombra de dúvidas, o dia mais engraçado e divertido do ano inteiro. Sentados na escada do Jambalaia - o conjunto habitacional onde ele mora -, precisamos nos conter para não descê-la rolando de tanto rir. Voltei para casa aquele dia com o maxilar doendo de tantas risadas - e com a certeza de que ter o Léo por perto seria uma ótima ideia.

Mas não pensem que o Léo está aqui nessa lista por ser um palhaço. Mesmo porque de palhaço ele não tem nada: seu humor é no ponto, natural, sem exageros. Sua presença aqui se justifica pela pessoa maravilhosa que ele é, daquele tipo que você se sente bem só de estar perto, que traz boas vibrações, que te faz bem. Obrigado pelas risadas, pelos conselhos, pela companhia e por ter tornado o ano cinza de 2009 um pouquinho mais colorido, bicha. =)


3- Santa Dorotéia.

Como colocar em apenas um post tudo o que essa faculdade representa para mim neste momento da minha vida? Tudo que posso dizer é que cada dia ali dentro foi um dia de crescimento íntimo, de evolução intelectual, de aperfeiçoamento no meu modo de pensar. Mesmo as aulas que não acrescentavam nada, que pareciam estar ali só pra contar no currículo - me absterei de citar nomes - foram importantes, me fizeram criar disciplina e aprender a estudar.

Mas as coisas na Santa Dorotéia não fariam o mesmo sentido se não fosse 3 pessoas em especial: uma quase-neurótica, uma patricinha nervosa, uma nerd viciada em filmes europeus e um gay mal-humorado. Podia ser o cast de um sitcom americano, mas o nosso grupo é constituído assim. E que perrengue a gente passa pra conseguir manter unido um grupo tão heterogêneo de cabeças pensantes, com opiniões próprias e personalidades explosivas! Quantas foram as vezes que brigamos, discutimos, mandamos - entre os dentes e baixinho, pra que a outra pessoa não ouvisse - o outro tomar naquele lugar... Quantas discrepâncias de opiniões durante os trabalhos, quanta raiva temporária por atrasos e faltas e, principalmente, quantas calorias adquiridas com o salgado mais massudo do mundo no Quinta's Café.

Mas, na minha opinião, é graças a todas essas diferenças que o nosso grupo de amizade vai se tornando mais forte a cada dia que passa. E eu queria que vocês três, meninas, soubessem que amo vocês demais da conta, cada uma de um jeitinho diferente, mas com muita sinceridade. E saibam também que essa faculdade não teria graça alguma se não estivéssemos juntos, deferindo críticas mortais a tudo e todos, rindo mais de nós mesmos do que de tudo mais e compartilhando essa fase maravilhosa de nossas vidas.

E me sinto honrado de ser, como Carol disse, "a cola que mantém o nosso grupo unido". E continuarei mantendo, não importa o que aconteça, até que tenhamos nosso diploma nas mãos e possamos não mais ter que "nos aturar", rs. Amo vocês, meninas, e obrigado por tudo.



2- Tião.

Esse é um assunto que já foi discutido, argumentado, narrado e romanceado à exaustão, mas é impossível narrar os acontecimentos de 2009 sem passar pelo mês de junho. Contudo prometo que essa é a última vez que falo do assunto.

Eu não posso nem tentar negar que o mês de junho e, principalmente, o dia 28, foi um dos perídos mais felizes da minha vida. Aquele tipo de felicidade que fica estampado na cara, que as pessoas veem, comentam, sabem que você está bem, sabem que você tem alguém - ou, que pelo menos, pensa ter. E quando penso em Tião hoje em dia, é dessa felicidade que tento me lembrar, desses momentos que ele me proporcionou, desses estado que até agora ninguém conseguiu despertar novamente. E não há motivos para eu associar a sua imagem ao que veio depois, porque ninguém teve culpa da dor que foi causada ou dos meses que passei com um vazio que não cabia em mim. Se fui usado, foi porque permiti; se fui enganado, foi porque enganei a mim mesmo primeiro; e se ele foi sincero, como diz ser, é sinal de que não era pra ter sido mesmo.

De tudo isso, levo pra 2010 um aprendizado que eu não poderia ter de outra forma. Precisamos mesmo, às vezes, tomar tombos, rolar escada abaixo, sangrar e sangrar por meses a fio. E então, quando as feridas começam a cicatrizar, quando você respira fundo, olha pra trás e vê o quanto cresceu e amadureceu com esse tombo, você se sente renovado, pronto para o que vier.

Você, Tião, foi o meu maior tombo. Mas eu aprendi muito com as cicatrizes que você deixou, pode ter certeza. Obrigado por tudo.


1- Diego.

Eu não gosto de encarar a vida como algo circular, que tem reinícios periódicos e que nos leva quando bem entende a um ponto por onde já passamos. Por isso não gosto de aniversários ou de ano-novo. Afinal, no dia 1º de janeiro eu me sinto exatamente o mesmo que eu era no dia 31 de dezembro. Não há recomeço; não há mudanças bruscas que caracterizem esse movimento circular de estar novamente em algum lugar que você já esteve. (um monte de baboseira que eu disse, mas, se você esforçar-se, pode encontrar algum sentido, rs.)

Entretanto, em 2009, eu fui pego de surpresa por uma dessas reviravoltas da vida e, depois de algum tempo meio afastado do Diego, o tal movimento circular no qual não acredito nos forçou a retomar a amizade que sempre tivemos. E hoje eu posso dizer sem qualquer sombra de dúvidas que ele foi a pessoa mais importante do ano pra mim. Não que tenha ocorrido uma eleição para tal posto ou que eu esteja medindo algo tão imensurável quanto o amor pelas pessoas, mas tudo que passei não teria tido o mesmo sentido se eu não tivesse tido você ao meu lado.

E o processo foi longo, mas natural. Tivemos que acostumarmo-nos um com o outro novamente e, você, principalmente, teve que acostumar-se com um pequeno novo detalhe. Confesso que sempre achei que você seria o mais inflexível em relação a isso, mas você mostrou-se compreensível e disposto a aprender a conviver dessa forma. Sei que fez isso por amor a mim, e isso só fez crescer a admiração que sempre tive por você. E assim que transpomos as primeiras dificuldades causadas por essa nova situação, criamos novos laços, mais fortes que todos os outros que nossa amizade já conhecera.



Passamos por muitas coisas esse ano, compartilhamos mais tristeza, solidão e depressão do que momentos felizes. Mas, em meio a tudo isso, encontramos juntos motivos pra sorrir, dividimos o tédio irmamente e, principalmente, não deixamos o outro desistir. Eu não sei como teria sido sem você e fico feliz de não ter que imaginar isso, porque você esteve aqui cada vez que precisei e me ajudou a seguir em frente nessa porcaria de ano que tivemos.

E eu sei bem que um dia você se vai de novo. Faz parte de você ser assim e nada nem ninguém vai mudar isso. Mas, mesmo quando estivermos distantes novamente, eu me lembrarei que sobrevivi ao ano de 2009 porque você esteve comigo. E serei grato por isso para sempre.

sábado, 28 de novembro de 2009

música e divagações: "Sou", por Marcelo Camelo.

Essa é a segunda edição do "Musica e Divagações", uma coluna do meu humilde bloguinho que eu gostei muito de fazer pela espontaneidade com que as palavras saem com um trilha-sonora de fundo. Mas fiquei realmente em dúvida sobre qual álbum escolher desta vez, até perceber que eu PRECISAVA escrever sobre o primeiro álbum solo do Marcelo Camelo. O porquê dessa escolha? Bem, vamos apertar o Play e aí a gente conversa...



Faixa 1: Téo e a Gaivota

"todo amor encontra sempre a solidão."

Okay, eu sei que falar d
este cd já virou assunto obsoleto, velho e ultrapassado, afinal, esse álbum é de meados do ano passado. Mas houve uma injustiça tamanha do recebimento de algumas pessoas para com essa obra. Os fãs alvoroçados do Los Hermanos não conseguiram entender muito bem a proposta do Camelo para sua carreira a solo e o que eu li de besteira por aí sobre esse álbum não está no gibi.

Confesso que meu primeiro momento diante do "Sou" também não foi lá uma experiência única e inesquecível. Acabei fazendo um desses downloads capengas que vazam antes mesmo do lançamento e o set list veio fora de ordem, trazendo "Copacapana" como faixa 1. Pensei no mesmo momento: "Puta que pariu, Camelo! O Amarante já tá fazendo isso no Orquestra!" ¬¬'
Mas não demorou para o encantamento começar a tomar conta de mim, pouco a pouco, devagar. As audições vieram lentamente, às vezes batia aquela preguicinha - porque o "Sou" não é nem de longe um álbum de fácil audição. E foi bem de repente que me peguei totalmente fascinado por cada um dos 55 minutos que compõem esse álbum.


Faixa 2: Tudo Passa
"os ais e os hãos de ser e todos os casais também."

Mas o que causou toda essa proximidade a este álbum particularmente? Okay, eu posso estar sendo um tantinho hiperbólico nessa minha próxima fala, mas arriscarei mesmo assim, com a certeza de que posso me arrepender de ter dito isso algum dia:

"Sou" é o disco da minha vida.

Uow... vejam que eu realmente acredito nisso.. Letras grandes, em negritos.. Quem sabe eu não faça uma tatuagem, rs. Just kidding.
A verdade é que são poucas as obras de artes em que eu consigo me encaixar plenamente, me ver retratado, me sentir inserido nela. Acho que o nome disso é catarse, não é Simone? (minha maravilhosa professora de Teoria da Literatura que me transmitiu em 1 ano mais conhecimento do que jamais consegui juntar nos outros 22 anos da minha vida)


Faixa 3: Passeando

"estamos sós."

Nossa, essa é nostálgica *_*

Ouça esse dedilhado... sinta a simplicidade...

Caceta! rs
.

Mas então... voltando ao assunto...
Catarse é um sentimento que lhe invade ao peito quando você está fruindo de uma obra de arte. Você pode sofrer Catarse de dois modos: sensibilizando-se dos sentimentos e dores retratados na arte pelo fato de nunca ter acontecido contigo - aquele sentimentozinho de alívio ao fim de um filme onde o casal apaixonado termina separado, por exemplo, e você pode dar graças a Zeus porque o seu amado está ainda do seu lado.


Faixa 4: Doce Solidão
"foge que eu te encontro que eu já tenho asas."

(...)
E há, em contraponto, a Catarse onde o que acontece na obra de arte parece, aos seus olhos, uma autobiografia. Aquele filme ou música que parece ter sido escrito para você, sabe? É esse tipo de catarse que eu sofro ao ouvir o "Sou". Nunca antes tinha visto meus sentimentos tão bem resumidos em apenas um discozinho brilhante. (E esse assovio de Doce Solidão? Nunca mais saiu da minha cabeça desde a primeira vez que ouvi essa faixa.)
E sim, "Sou" é um disco que fala em sua maior parte de solidão. Acho que a palavra está presente em quase todas as faixas, quando não explicitamente, escondida em algum sentido mais profundo.



Faixa 5: Janta (com Mallu Magalhães)
"caminho em frente pra sentir saudade"

Até mesmo esta faixa, que tem por essência um relacionamento, fala da solidão que existe na vida a dois. Eu amo essa faixa de paixão, mesmo com os miados da Mallu, rs. E é uma faixa que sempre serve de trilha sonora quando estou envolvido com alguém, porque em todo "relacionamento" - que saco ter que usar estas aspas, mas ainda não posso usar a palavra relaciomento no seu sentido conotativo - que me envolvo, a solidão, a tristeza e a saudade ficam espreitando à porta, me deixando inseguro, sem perspectiva... assim, tais versos simbolizam o meu medo do filme sempre se repetir:
"eu quis te conhecer, mas chega de insistir caberá ao nosso amor o que há de vir." E, infelizmente, toda vez que usei esses versos para lançar à sorte meu envolvimento com alguém, o resultado foi solidão.



Faixa 6: Mais Tarde
"acho que não vai dar, tô cansado demais."

Ah, solidão.
Ultimamente eu tenho sido muito questionado sobre minha solidão. Sobre meus hábitos taciturnos, minhas fotos tristes, meu gosto por música e filmes depressivos... E minha resposta é sempre a mesma: eu não posso fugir do que sou. Quando tiro uma foto que fica triste, nostálgica, depressiva, não é porque quero que ela saia assim. Não falo: "Peraí, Diego, espera eu ficar bem triste.. quando vir meus olhos marejar, você tira a foto, okay?" Não é assim que as coisas acontecem.

O problema é que, na verdade, quem me conhece, sabe que eu sou a pessoa que mais ri nesse mundo. Adoro dar risada, rio até da coisa mais sem graça do mundo e tenho sempre pronta uma piadinha sem vergonha para fazer. E não faço isso para parecer feliz perante a sociedade, nada disso. Tampouco uso isso para dissimular com meus amigos o que realmente sinto. Eu não tenho motivos para fazer algo do gênero. Tassiane esses dias me disse que eu preciso parar de colocar fotos depressivas no orkut, que tenho que parar de mostrar para as pessoas que sou assim. E minha resposta para ela foi simples e inexorável:


Faixa 7: Menina Bordada
"moça por favor, cuida bem de mim."

(...)

EU NÃO POSSO FUGIR DO QUE SOU!

E se minhas fotos saem da forma que saem, talvez estejam refletindo o que está na minha alma. E que mal pode haver em algo assim? Em você poder expressar o que você realmente é, sem máscaras, sem maquiagem... você, cru, de verdade. Eu só vejo beleza em uma coisa dessas.


Portanto, concluindo esse papo doido, passou da hora de refletirmos sobre esse paradigma de que a tristeza é má. Okay? Podemos ser mais sensatos que isso. Pra mim, toda boa obra de arte tem uma boa dose de tristeza e minha essência também é feita disso. É essa tristeza íntima e benéfica que me faz ter a visão de mundo peculiar que tenho.
Obviamente que às vezes essa essência me faz mal e me deixa triste do jeito ruim da palavra. Mas tudo na vida tem esse lado pesado e obscuro.. e chega de filosofia de boteco que eu já estou falando bobagem, rs.


Faixa 8: Liberdade (com Dominguinhos)

"é deus, parece que vai ser nós dois até o final."

Bom, como falei quando fiz o "Música e Divagações do Kings", eu não tenho nenhum conhecimento teórico sobre música. O meu gosto vai muito por alguma coisa íntima, uma melodia que me pega desprevinido, um som que me faz sonhar e viajar, um verso que significa muito mais que palavras em um ordem sintática... E eu gosto muito dessa relação que tenho com a música, uma relação que parece uma amizade. Às vezes você tem amigos que não são lá grandes gênios contemporâneos, mas você ama aquela pessoa do jeitinho que ela é... E a música pra mim pode ser a mais simples possível, contanto que desperte em mim algum sentimento bom.



Faixa 9: Saudade (instrumental, por Clara Sverner)


(...) Digo isso tudo porque este álbum do Camelo tem seus momentos orquestrais e tem momentos da pura simplicidade de um violão dedilhado. Se "Téo e Gaivota" tem sua beleza complexa ressaltada pela particapação do Hurtmold - banda de música instrumental que acompanhou o Camelo na gravação do álbum e na turnê -, "Saudade" à voz e violão não perde um mísero ponto por ser mais simples e delicada.
Essa é apenas uma agulhadinha em gente que acha que música é aquela que faz quebrar os dedos pela complexidade das notas.
Há música na simplicidade. E bela música, por sinal.


Faixa 10: Santa Chuva

"meu coração já se cansou de falsidade."

Essa aí ele escreveu, deu de presente para a Maria Rita e depois tomou de volta, rs. Eu gosto muito mais da versão dele. E é engraçado que na época do Los Hermanos eu sempre fui mais fã das canções do Amarante. As do ruivo sempre eram as consideradas favoritas por mim, até que, ao ouvir o "Sou", fui levado a uma reflexão profunda sobre o lirismo de Camelo. Não que desgostei das do Amarante, mas passei a dar mais importância a canções que antes me passam meio despercebidas.




Faixa 11: Copacabana
"todo destino padece aqui."

Aaaah, olha a dita cuja aí! rs.
Okay, estranhei ela de começo, mas agora eu adoro. Mesmo odiando carnaval e as coisas que remetem a ele... Mas essa música tem um ar nostálgico da época que o carnaval parecia ser uma coisa bacana... Gostaria de ter presenciado essa época do carnaval.


Faixa 12: Vida Doce
"assim eu caminho no tempo que eu bem entender."

Puta que Paréu! Eu sou completamente apaixonado por esta música.
Adoro o ritmo de carimbó, adoro a letra, adoro o jeito arrasto do Marcelo cantar... Essa é, a propósito, o toque do meu celular, rs.. Sendo que ando precisando trocar isso, porque me traz más recordações >.< Bem, vou começar as considerações finais, porque com certeza elas renderão as próximas 2 faixas. Meu amor por esse cd cresce a cada dia mais, a cada escutada, a cada análise das nuances das letras, a cada descoberta de um novo som, uma sutileza no dedilhado ou um minúcia no tom de voz do Camelo.


Faixa 13: Saudade

"amor, eu vivo tão sozinho de saudade."

(...)
E esse amor é sim um amor triste, porque "Sou" é uma obra triste. Mas ela revela em suas entrelinhas uma esperança de uma Vida mais Doce, de um encontro com a Liberdade, de acontecimentos felizes guadados para Mais Tarde. E precisamos aprender a ver sutilezas escondidas na tristeza e na solidão. Porque o crescimento e amadurecimento sentimental estão escondidos nos momentos em que sofremos. Não há crescimento na alegria, não há reflexão num momento feliz. Pelo menos assim eu acho.


Faixa 14: Passeando (instrumental, por Clara Sverner)


Obrigado, Camelo, por ter colocado toda a sua alma em cada nota desse álbum e ter compartilhado com a gente a transparência de sua sensibilidade. E fica assim: até segunda ordem, "Sou" é um retrato dos recônditos mais profundos da minha alma.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

sobre sonhos - e o autoconhecimento que eles provêm.

E quando seu coração acostumou-se com a tênue ausência e quando a dor voraz que sentira transformou-se num incômodo insignificante em suas noites insones, aquela longínqua tarde cinzenta de domingo foi envernizada com uma aura onírica que lhe trazia um pequeno sorriso de satisfação ao rosto. Um sonho doce, despretensioso, com um quê de sagrado e um gosto de eternidade. Tinha dias que sequer conseguia distinguir se ele realmente existira; o conceito de realidade se extinguia diante da perfeição indubitável daquele momento e lhe parecia um tanto mais plausível aceitar a condição de que ele fora um capricho de sua mente criativa.

Havia, entretanto, algumas fotografias que impunham friamente um inexorável tom de existência àquela tarde. Mesmo assim, de todas as fotos, ele só conseguia associar verossimilhança à qual estava sozinho, mãos afundadas no bolso e expressão de contentamento. Sozinho, somente ele, o mar calmo e o céu cinza. Não seria talvez uma mentira cômoda esse papo de que ninguém nasce para ficar sozinho? Uma convenção social para aqueles que não podiam encarar a realidade de que viveriam e morreriam sozinhos? Ele sempre fora, por excelência, um solitário. Entendia-se na individualidade de sua alma e descobrira que estar com outra pessoa não era nada senão um sonho. “Talvez a vida baseie-se nisso: na dor causada por esses filhos-da-puta e no nosso esforço sobre-humano de reconstruirmo-nos e colocarmo-nos de pé novamente”, ele pensava agora.

E quando tornou-se capaz de separar sobriamente o sofrimento que lhe fora causado deste sonho paradoxalmente efêmero e eterno, descobriu tanto de si mesmo que, por um breve momento, assombrou-se. Era agora nítido que não devia nunca diminuir-se pela escolha de outrem de não permanecer ao seu lado, afinal, talvez a magnitude de seu ser não podia ser compreendido pelo outro. E pensava nisso sem soberba ou pretensões que não lhe cabiam, mas com a verdadeira modéstia de quem compreende-se pela primeira vez e percebe que é maior do que sempre pensou ser possível ser. Não sentia-se mais incompleto diante da rejeição, pois tinha em si mesmo a completude de entender-se por fim. E gostava da forma como suas qualidades e defeitos, seus conhecimentos e suas ignorâncias fundiam-se no intuito de formar uma personalidade única, porém, ordinária; complexa e, ao mesmo tempo, simplista.

Mais do que tudo, aprendera que as pessoas que escolhem não fazer parte de sua vida não levavam nada dele, não sedimentavam o todo que ele compunha. Não era possível dividir sua essência, porque ele era muito mais que um conjunto de características idiossincráticas justapostas de qualquer forma. E que satisfação intumesceu-lhe a alma ao sentir-se pela primeira vez único, completo e digno da vida.

Ele podia estar longe de ser a beleza de um poema de Drummond, mas tampouco era a mediocridade de um romance de Paulo Coelho. Ele descobriu um equilíbrio entre a complexidade do seu ser e a simplicidade de encarar a vida através do seu ritmo natural. E, por enquanto, isso lhe bastava plenamente.


sexta-feira, 30 de outubro de 2009

"De volta aos meus oito anos"

Nota: Eu escrevi esse texto para um trabalho de Teoria da Literatura na faculdade, onde eu precisava fazer uma paráfrase ou paródia que tivesse uma relação intertextual com o poema "Meus Oito Anos", de Casimiro de Abreu. Quem sou eu para fazer uma coisa dessas! Mas as meninas do grupo apreciaram o resultado e, por essa razão, resolvi postá-lo nesse cantinho. Afinal, eu falo pouco da faculdade aqui e é legal mostrar, de vez em quando, o que ando fazendo por lá.
Depois me contem o que acharam do texto. Gostaria da opinião sincera de vocês.


"De volta aos meus oito anos", por Raphael Cardoso


"Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!"
(Casimiro de Abreu)

Quando as marcas do tempo tomaram formas físicas e enrugadas em meu rosto pálido e quando o peso dos anos materializou-se sobre meus ombros, curvando abruptamente minha coluna, fui deixado para desvanecer lentamente num pardieiro imundo disfarçado de casa de repouso. Eram dias em que o negrume da morte encolhia-se no canto do quarto empoeirado, esperando ansiosamente um fracasso previsível do meu cansado coração. O sonho dourado desbotava-se em pesadelo frio de ferro; o hino de amor silenciava-se gradativamente em um murmúrio de agonia.

Certo dia ensolarado, pedi amigavelmente a um dos enfermeiros por quem tinha enorme apreço para me levar ao mar, que não ficava tão longe, para que meus olhos desfocados pudessem, por uma última vez, apreciar a imensidão azul. Em sua já conhecida boa vontade, em seu uniforme alvo impecável, o anjo acomodou-me com dificuldade na ambulância enferrujada que o asilo dispunha e levou-me à praia. Segurou com seus dedos fortes a minha mão ossuda e guiou-me pela areia fina até o mar sereno. Vi meus pés cansados e velhos sumirem numa pequenina onda borbulhante. Então, quando a água retornou, sorri surpreendido ao mirar, no mesmo lugar dantes, dois pezinhos vigorosos sentindo as cócegas causadas pela areia acumulada entre os dedos. Senti-me forte, revigorado, pronto para trepar em árvores para colher frutos ou para correr pelas campinas a caçar borboletas. Mas a saudade da minha infância era tão grande, que nada disso era prioridade. Com toda gratidão que me era possível, virei para o enfermeiro e disse-lhe:

— Pode soltar minha mão agora, anjo. Minha mãe deseja segurá-la.

Seu rosto jovial contorceu-se em dúvida, mas ele acatou meu pedido. Foi quando senti a mão suave de minha mãe entrelaçando-se com a minha, o que trouxe lágrimas repentinas aos meus olhos cansados.

— Ei, pequeno — sua voz doce, mas rigorosa, ressoou aos meus ouvidos —, por que choras? És o primeiro rapazinho de oito anos que vejo se emocionar ao ver o mar. Vás brincar, menino! Pares de manha.

A aurora de minha vida estava novamente descortinada diante de mim, como se fosse possível rejuvenescer a inocência de minha alma. Mas o toque do anjo no meu ombro trouxe-me com um baque de volta à realidade:

— Já é hora de voltar, senhor.

E então, o mar escondeu os pezinhos com sua água cristalina e, quando a onda regressou, pés calejados e fracos encontravam-se em seu lugar. Lancei um último sorriso desdentado para o mar e caminhei ao lado do anjo, de volta para o carro.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

sobre as cercas — e o que quer que elas dividem.

Há 10 minutos atrás, acabei de ler o best-seller de John Boyne “O Menino do Pijama Listrado”, muito comentado e na maioria das listinhas de pessoas que leem o que tá na moda e o que está sendo indicado pela revista Veja. O livro, como vários outros já fizeram à exaustão, trata dos terrores da II Guerra Mundial e sequer há inovação na escolha de abordar o assunto pela perspectiva de uma criança — já que, há alguns anos atrás, a autora de outro best-seller, "A Menina que Roubava Livros", usou com tanta beleza tal recurso.

Portanto, qual o motivo do burburinho em torno deste romance?

Eu não tenho resposta para tal pergunta, mas falo por mim ao dizer que Boyne me encantou com a sensibilidade colocada homeopaticamente em cada palavra das 186 páginas de sua história. Sem errar na medida, sem abusar de um melodrama que muitas vezes inunda histórias com essa temática, o terror do holocausto se torna um eufemismo que somente a pureza dos olhos de uma criança poderia captar. E esse é o grande trunfo do autor: colocar em sua narrativa brilhantemente a visão do mundo de Bruno, o menininho de 9 anos que não entende porque teve de deixar Berlin, porque há uma cerca separando sua nova casa de um campo onde todas as pessoas usam pijamas listrados ou porque os soldados “entram e saem da sua casa como se mandassem no lugar”, nas próprias palavras do menino.

Assim, para conseguirmos usufruir e gostar do livro, é necessário ver o mundo pela ótica de Bruno: o Fürer torna-se o Fúria, o campo de concentração de Auschwitz se torna Haja Vista e o problema de bebida da mãe pode transforma-se num simples vício em xerez medicional. Esse mundo de eufemismo criado pelo autor é tão atraente que nos sentimos forçados a acatar a ideia e esquecer-nos das atrocidades causadas pelo regime nazista e fingir — pelo menos por um instante — que tudo não passa de um imbróglio para o qual Bruno não encontra explicação.



E tudo leva à amizade dos dois meninos, um alemão e um judeu, onde o autor prefere apontar as semelhanças às diferenças, o que os aproxima do que os separa. Mais uma abordagem sensível, sutil e simples de John Boyne.

No fim do livro, tomado pelo sarcasmo característico da irmã mais velha de Bruno, Gretel — o Caso Perdido — Boyne diz:

“Claro que tudo isso aconteceu há muito tempo
e nada parecido poderia acontecer de novo.
Não na nossa época.”

Infelizmente, sabemos plenamente que ainda há muitas cercas separando os seres humanos e que estamos longe de ser agrupados pelas nossas semelhanças, prevalecendo a separação e o preconceito pelas nossas diferenças.

Quisera cada um ter um pouquinho de Bruno e sua inocência dentro de si...